As prefeituras de todo o país têm até julho para apresentar propostas de como destinar corretamente os resíduos sólidos, em adequação ao Marco do Saneamento, aprovado e sancionado em 2020. Desde 2019, 601 lixões deixaram de ser utilizados no Brasil, o que representa 18,5% do total. No entanto, outros 2.655 ainda estão em atividade.
Segundo o Marco do Saneamento, os prazos para extinção dos lixões são os seguintes: capitais e regiões metropolitanas, 2 de agosto de 2021; cidades com mais de 100 mil habitantes, agosto de 2022; entre 50 mil e 100 mil habitantes, até 2023; menos de 50 mil habitantes, até 2024.
Eles variam de acordo com o número de habitantes e os tamanhos das cidades para que não haja injustiças. Por isso, o problema precisa ser erradicado antes nas metrópoles, que têm mais recursos e geram mais resíduos, da ordem de 17 mil toneladas ao dia.
“É espetacular que 600 cidades deixem de levar os resíduos a locais inadequados e passem a levar a aterros sanitários públicos ou privados de outros municípios. Mas as áreas contaminadas continuam lá e não deixaram de aparecer nos mapas. É um salto, mas ainda há muito no que se avançar”, afirma o presidente da Abetre (Associação Brasileira de Empresas de Tratamento de Resíduos e Efluentes), Luiz Gonzaga Alves Pereira.
Especialistas do setor defendem que o serviço seja concedido à iniciativa privada, com cobrança de tarifa ao consumidor. Hoje a coleta e o descarte de lixo estão sob a responsabilidade da prefeitura, que usa a verba do orçamento para prestação do serviço. No entanto os moradores sequer sabem a destinação do lixo ou quanto pagam por ele – o que, de certa forma, incentiva o desperdício.
Responsabilidade
“Temos que ser responsáveis pelo lixo gerado. Se não quiser gastar mais, gere menos resíduos. É grande a produção de lixo no Brasil, há um excesso de embalagens, e temos afetado em demasia o meio ambiente. A prefeitura tem que ser fiscalizadora e não prestadora do serviço. O concessionário deve cobrar pelo que oferece, como as rodovias pedagiadas, a luz ou água. Essa não é uma missão do poder público”, esclarece Luiz Gonzaga.
O diretor de sustentabilidade do Selurb (Sindicato Nacional das Empresas de Limpeza Urbana), Carlos Rossin, afirma que há uma correlação direta entre a tarifa cobrada pelo serviço e a destinação correta dos resíduos. “Quem não tem arrecadação específica, usa os lixões. Onde há tarifa, não tem lixão. No orçamento municipal não tem dinheiro para destinar os resíduos e jogam em qualquer lugar. O caminho é estancar o problema com a desativação dos lixões”, ressalta.
Também o presidente da ABLP (Associação Brasileira de Resíduos Sólidos e Limpeza Pública), João Gianesi Netto, criticou a situação dos lixões: “É vergonhosa. Além de crime ambiental e das contaminações das águas subterrâneas, do solo e do ar, soma-se a realidade deprimente das pessoas que lá convivem, disputando a carga de lixo, materiais para reciclagem e até alimento”.
O Brasil gera, por dia, cerca de 200 mil toneladas de resíduos sólidos. Do total, ao menos 35 mil toneladas terminam em lixões. Apesar de proibida, a prática ainda é comum.
Índice de Sustentabilidade da Limpeza Urbana
De acordo com o ISLU (Índice de Sustentabilidade da Limpeza Urbana) 2020, entre as cidades com população acima de 250 mil habitantes, a média coletada foi de 343 quilos por habitante ao ano.
Por exemplo, o município com menor quantidade de resíduos per capita/ano é Blumenau, com 237 quilos. Já Santos, no litoral paulista, e Rio de Janeiro são os que registram a maior produção, com mais de 460 quilos por pessoa ao ano. Isso significa que cada habitante gera mais de 1,2 quilo de resíduos diariamente.
De acordo com o ISLU, a despesa total com o serviço de limpeza urbana por habitante ao ano varia de acordo com o município. As cidades de Niterói e do Rio de Janeiro foram as que apresentaram os maiores gastos: R$ 479 e R$ 298.
Entre os estados, Santa Catarina é o modelo a ser seguido e hoje já não tem mais lixões em atividade. O estado adotou a concessão do serviço. As realidades, no entanto, variam muito no Brasil. No entanto não há uma solução única para enfrentar o desafio da erradicação dos lixões.
Segundo o ISLU, 58% dos municípios ainda não estabeleceram uma fonte de arrecadação específica para custear a atividade. Os menores são os que enfrentam mais adversidades por falta de recursos. Uma das opções é a união com as demais cidades do entorno para criação de uma proposta regionalizada ou um consórcio para prestação do serviço.
Nas cidades com menos de 50 mil habitantes, que dependem do orçamento municipal, a solução passa pela regionalização. Assim, o projeto de manejo de resíduos ganha escala, com a repartição dos custos entre os municípios.
Há ainda cidades que têm aterros próprios, mas que recebem o lixo de outras cidades do entorno. Um exemplo é Caieiras, na Grande São Paulo, que recebe resíduos sólidos de 16 municípios.
Não há como fugir da legislação.
As prefeituras terão de apresentar até julho os modelos de serviço e cobrança que serão implementados a partir de dezembro. Caso não façam, vão responder pela renúncia fiscal por improbidade administrativa.
Os especialistas defendem a cobrança de uma tarifa pela concessária prestadora do serviço, com a mediação entre consumidor e empresa pela agência reguladora. É uma forma de responsabilizar o poluidor, que passa a ser pagador. Como resultado, grande parte da população vê a coleta de resíduos domiciliares como parte da limpeza urbana.
Os contratos de concessão, em geral, são por longos períodos, o que permite a diluição dos investimentos. Outras vantagens da prestação do serviço pela iniciativa privada seriam o emprego de tecnologia, o estímulo à concorrência do setor e a rapidez em adotar processos, sem a necessidade de realização de licitação pública.
Desde 2010, a lei estabelece que os resíduos devem, obrigatoriamente, passar por processos de tratamento antes da disposição final em aterros no Brasil. Eles vão desde a separação da matéria orgânica dos materiais recicláveis e rejeitos, até a geração de energia elétrica e aproveitamento do biogás.
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