O descarte do lixo é um problema que ainda está longe de ser solucionado no Brasil. Em 2020, por exemplo, o País gastou cerca de R$ 97 bilhões apenas com o impacto de falhas na gestão de resíduos sólidos urbanos. Os dados são de um estudo feito para a série Além do Lixo, do jornal Folha de S.Paulo.
Esses gastos indiretos são causados por falhas na gestão e também com recursos utilizados no combate aos danos à biodiversidade e à vida humana, causados pela poluição e contaminação do solo e da água.
Além destes custos, os resíduos sólidos consomem aproximadamente R$ 30,5 bilhões, valor majoritariamente oriundo de recursos públicos municipais, com despesas diretas no tratamento, como em coleta, transporte, aterramento e reciclagem.
A preocupação aumenta quando os custos diretos e indiretos são somados. Um total de cerca de R$ 120,6 bilhões foram utilizados com lixo no Brasil em 2020.
E o cenário fica ainda mais assustador diante da quantidade de lixo gerado no País. Anualmente, cerca de 80 milhões de toneladas de restos de alimentos, papel, metais, vidro, roupas e outros resíduos são gerados em território brasileiro. Para se ter uma ideia, a quantia seria suficiente para encher 2 mil estádios do Maracanã.
Para piorar a situação, destes resíduos, apenas 4% são devidamente coletados e reciclados. Os outros 96% vão para aterros sanitários, lixões ou ficam expostos em terrenos, ruas, rios e, claro, oceanos.
Problemas para o futuro
De acordo com o estudo, se o ritmo seguir como está, o volume de lixo deve aumentar quase 80% e chegar aos 3,8 bilhões de toneladas em 2050. Isso representaria R$ 168,4 bilhões de custos totais com resíduos sólidos.
Deste total, R$ 135,9 bilhões seriam com os citados custos indiretos gerados pelos problemas no tratamento do lixo.
Como diminuir esse problema?
Em conversa com o Terra, o professor José Carlos Mierzw, da Universidade de São Paulo (USP), apontou o modelo de aterramento como um problema no País. Para ele, conceitos diferenciados de reciclagem devem ser usados antes da opção pelos aterros.
“Enterrar resíduo sólido é uma coisa bastante atrasada. Os países mais modernos só usam esse recurso em último caso. A ideia é como recuperar recursos. Neste caso, teríamos que usar conceitos de reciclagem diferenciados, como reciclagem energética ou por outras formas”, explica o pesquisador.
“Mas as pessoas normalmente, por uma interpretação ambiental equivocada, acham que esses processos não podem ser utilizados. E nisso perpetua o conceito de enterrar lixo”, completa.
De acordo com Mierzw, o espaço para aterramentos é limitado. Uma solução para mudar a maneira como o lixo é tratado é lidar com os resíduos como fonte de recursos:
“Vai chegar uma hora que não vai mais ter lugar para enterrar lixo. A questão básica é seguir o que propõe a Política Nacional de Resíduos Sólidos. Ou seja, entender que resíduos são uma fonte de recurso. Antes de optar pela destinação final em aterro, você teria que esgotar as possibilidades de recuperar os recursos presentes, sejam materiais ou energéticos”
Como exemplo a ser seguido na maneira de enxergar os resíduos, o professor destacou o potencial brasileiro na reutilização de alumínio. Em 2021, por exemplo, o País reciclou 98,7% das latas comercializadas, segundo dados do Ministério do Meio Ambiente.
“Se você pegar um dado básico, o Brasil é o país que mais recicla alumínio no mundo. A questão é que o alumínio tem um valor agregado alto e muita gente acaba ganhando dinheiro com o alumínio. Temos a capacidade de reinserir esse resíduo no mercado”, ressaltou.
Além da mudança na maneira de olhar para os resíduos, Mierzw menciona a dificuldade da indústria em encontrar valor na reciclagem de plástico, uma das principais fontes de lixo do Brasil. Neste caso, uma mudança na triagem pode ser uma solução para melhorar os custos.
“Plástico, por outro lado, não tem [mesmo valor que o alumínio]. Tem que criar uma abordagem da seguinte forma: mudar a filosofia de coleta de resíduos, ter centrais de triagem automatizadas. Ao invés de ter estações altamente automatizadas, o Brasil fez compra de estações semi-automatizadas”, conclui o professor da USP.